PEC do Plasma: Especialistas respondem às principais dúvidas

PEC do Plasma: Especialistas respondem às principais dúvidas

PEC do Plasma: Especialistas respondem às principais dúvidas

A PEC do Plasma virou polêmica, e uma verdadeira enxurrada de fake news tomou conta do debate causando insegurança, medo e até podendo afetar a vida de milhares de pacientes que dependem dos medicamentos produzidos com plasma humano.

Sendo assim, o Departamento Científico de Erros Inatos da Imunidade da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) reuniu as principais dúvidas e mitos, visando esclarecer e contribuir para que a informação chegue a todos, beneficiando pacientes com imunodeficiências/erros inatos da imunidade e suas famílias.

  • Qual a diferença de sangue e plasma e qual a vantagem de captar plasma para produzir imunoglobulina?

O sangue é composto de células (glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas) e um líquido contendo uma série de substâncias, entre elas fatores de coagulação e anticorpos. Esse líquido é o plasma.

A doação de sangue não pode ser feita sempre, pois o indivíduo que doa não consegue repor todos esses componentes rapidamente.

Já a captação exclusiva de plasma requer aparelhos especiais, que separam esse componente líquido das células do paciente. Quando o indivíduo doa apenas o plasma, isso pode ser feito com mais frequência, pois esses componentes se reconstituem rapidamente.

  • Se a PEC do Plasma for aprovada, as pessoas vão receber dinheiro em troca de doação de sangue e, consequentemente, do plasma?

Não é disso que trata a PEC. Ela apenas abre a possibilidade de que empresas privadas, sob demanda do Ministério da Saúde, atuem na captação de plasma. A captação de plasma sem que seja doado sangue demanda investimentos altos que, possivelmente, o governo não terá condições de assumir.

  • No Brasil já existe compensação para doação de sangue. É verdade?

Sim, uma das compensações mais conhecidas para quem tem o hábito de doar sangue é o direito à folga, garantido em lei. Os estados têm independência para propor em seus municípios outras formas de recompensa. Na Paraíba, por exemplo, doadores regulares de sangue podem realizar exames de hemogramas gratuitos.

  • Tem algum risco de contrair alguma doença através do plasma?

A doação de sangue é totalmente diferente da doação de plasma. Na doação de sangue, você vai doar tudo, o seu sangue total, suas células, suas hemácias. Isso faz com que a doação de sangue seja feita a cada três meses no máximo, porque é preciso refazer as células.

Quando trabalhamos com sangue e células, não temos como fazer inativação de bactérias, vírus e outros componentes que estão nele, já que isso mata as células, que é foco principal.

Quando trabalhamos com plasma, existe a inativação, principalmente de vírus. Então, o risco de contaminação desse material é muito menor do que o risco em uma doação de sangue, na verdade, o risco é ínfimo.

  • Com a aprovação da PEC o comércio do plasma vai abrir portas para comercialização de órgãos.

Não. A PEC deixa claro que está vedada a comercialização de órgãos.

  • Com a aprovação da PEC do Plasma os doadores de sangue vão preferir doar plasma e vai faltar sangue.

Como não está previsto pagamento para doação de plasma, a preferência de doar plasma pode ocorrer por decisão pessoal e não por interesse econômico.

Além disso, como tem sido feito em outros países, pode-se definir que um doador somente poderá doar plasma caso realize doação de sangue total a cada três ou mais doações de plasma, por exemplo.

  • Se tiver comércio de plasma, vai ter comércio de sangue e o risco de começarem a cobrar por transfusões.

Não existe essa previsão na PEC. Importante frisar que no texto da PEC está explicitado que a participação da iniciativa privada na captação e processamento do plasma ocorrerá sob demanda do Ministério da Saúde.

  • Qual é o papel da iniciativa privada na PEC do Plasma?

O papel será definido pelo Ministério da Saúde: pode ser o de investir na estrutura para captação apenas de plasma e não de sangue total, pode ser o de produzir produtos a partir do plasma captado e fornecer a menores preços para o mercado brasileiro. Isso ainda não está regulamentado na PEC. Na PEC está apenas explicitado que o Ministério da Saúde controlará essa participação.

  • Com a aprovação da PEC do Plasma o número de doação de sangue vai diminuir?

Não há motivo para isso acontecer. Porém, uma medida que pode ser tomada é atrelar a doação de plasma à doação periódica de sangue. Mas isso tem que estar explicitado na lei, que será aplicada após a aprovação da PEC do Plasma.

Com a necessidade, principalmente, de imunoglobulinas, a Organização Mundial de Saúde fez o chamado para que vários países começassem a incentivar os programas de doação de plasma. E, nesse sentido, é preciso entender que a doação de sangue pode ser feita a cada 3, 4 meses, e o que sobra do plasma não é de uma qualidade boa, nem é suficiente para produzir hemoderivados.

Na doação de plasma, você doa só plasma. As células são devolvidas para o seu corpo. Como as hemácias são devolvidas para o corpo, você doa água, proteínas e alguns sais minerais, substâncias que o corpo consegue repor rapidamente. Então, o doador de plasma pode até doar toda semana. Com grande quantidade de plasma é possível produzir uma grande quantidade de hemoderivados, especialmente a imunoglobulina, aumentando a possibilidade de se dar conta da crescente demanda por esse hemoderivado e reduzindo a dependência das importações.

São sistemas de captação distintos, um não vai interferir no outro. Canadá, Alemanha, Polônia, Hungria, Finlândia e República Tcheca são países que já fazem captação de plasma em separado da doação de sangue total.

  • Atualmente, o Brasil consegue suprir a necessidade de plasma para atender a produção de imunoglobulina? (o medicamento salva vidas de pessoas com imunodeficiências/erros inatos da imunidade).

O Brasil não produz nenhuma gota de imunoglobulina a partir do plasma de seus cidadãos. Trata-se de um hemoderivado fundamental para manter e recuperar a saúde, prevenindo o adoecimento e morte de muitos brasileiros.

Infelizmente, hoje, não há perspectiva de que as medidas atualmente propostas pelo governo sejam capazes de suprir essa necessidade que é crescente não só no Brasil, mas no mundo.

Muitos países, de todos os continentes, estão preocupados com o assunto e procurando formas para se tornarem independentes do mercado internacional e, principalmente, da doação de plasma dos Estados Unidos.

O consumo de imunoglobulina cresce exponencialmente no mundo e muitos países estão buscando parcerias público/privadas para dar conta da demanda. Por que no Brasil deveria ser diferente?

  • Por que precisa ter a iniciativa privada envolvida? A Hemobrás, quando estiver funcionando, não poderá produzir os medicamentos com o plasma captado pelos hemocentros?

A Hemobrás foi criada há quase 20 anos e ainda não produziu uma gota de imunoglobulina em solo nacional. A empresa ainda não possui a tecnologia para produzir derivados do plasma, tampouco imunoglobulina e demais medicamentos feitos a partir do plasma humano”. Isso requer tempo e é um tempo que os pacientes não dispõem.

Após aquisição dessa tecnologia, por limitações estruturais não há previsão de que se consiga dar conta das necessidades atuais desses derivados do plasma, muito menos das necessidades que serão ainda maiores quando essa produção estiver acontecendo.

  • Se a iniciativa privada for autorizada a captar o plasma (além dos hemocentros), o valor dos medicamentos feitos a partir do plasma poderão ter reajustes?

A iniciativa privada necessita do plasma para produzir os medicamentos. Sendo possível captar o plasma em território brasileiro, os custos podem até ser reduzidos. Isso depende da política de impostos aplicados sobre essa produção, distribuição e comercialização. Se o governo estimular o estabelecimento de empresas internacionais no país, o custo pode ser ainda menor.

  • Só o Brasil quer colocar a iniciativa privada para captar plasma. Nos outros países não funciona assim, é verdade?

Em muitos países a captação de plasma é realizada por empresas privadas. Naqueles em que isso ainda não ocorre, o tema tem sido motivo de amplo debate. Muitos governos, inclusive de países ricos, não pretendem ou consideram assumir os custos de implementação da captação de plasma.

  • Se a captação e processamento do plasma hoje são insuficientes para atender a demanda brasileira, de onde vem os medicamentos feitos a partir do plasma, os chamados hemoderivados?

Os medicamentos vêm de empresas privadas internacionais, ou seja, de produção fora do Brasil, pagam impostos e geram empregos fora do Brasil. São medicamentos importados, com todos os custos implicados nessa importação. O comércio de plasma hoje já é uma realidade no Brasil, apenas participamos da maneira mais inadequada possível: importamos, pagando a peso de ouro, praticamente 100% da imunoglobulina que consumimos. O que tem sido feito para reduzir esse custo é permitir a importação pelo Ministério da Saúde de produtos não aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

 

15- Recentemente temos visto inúmeras notícias de apreensão de imunoglobulina falsificada, se o sistema atual fosse eficiente, isso estaria acontecendo?

Se tivéssemos captação de plasma e uma empresa de ponta para a produção dos medicamentos, com certeza isso seria minimizado, pois haveria imunoglobulina disponível em quantidade suficiente para suprir a demanda. O controle de medicamentos falsificados é uma outra questão a ser trabalhada pela administração federal. O governo não tem uma política pública que garanta o fornecimento de imunoglobulina de qualidade para os pacientes. Faz repetidas compras emergenciais, muitas vezes de medicamentos sem aprovação da Anvisa, o que gera enorme insegurança entre os pacientes e seus médicos.