Alergia alimentar
O que é alergia alimentar?
A alergia alimentar é uma reação adversa a um determinado alimento, envolvendo um mecanismo imunológico com apresentação clínica muito variável, com sintomas que podem surgir na pele, no sistema gastrointestinal e respiratório. As reações podem ser leves, como simples coceira nos lábios, até reações graves que podem comprometer vários órgãos. A alergia alimentar resulta de uma resposta exagerada do organismo a uma determinada substância presente nos alimentos.
O que é reação adversa a alimentos?
É qualquer reação indesejável que ocorre após ingestão de alimentos ou aditivos alimentares. Essas reações podem ser tóxicas e não-tóxicas. As não-tóxicas podem ser de intolerância ou hipersensibilidade.
Exemplo de reação não-alérgica são as reações por ingestão de alimentos contaminados por microrganismos, e que se apresentam agudamente com febre, vômitos, diarreia e geralmente acometem várias pessoas que ingeriram os alimentos contaminados.
A intolerância à lactose é uma reação alérgica?
A intolerância à lactose é uma desordem metabólica onde a ausência da enzima lactase no intestino determina uma incapacidade na digestão da lactose (açúcar do leite), que pode resultar em sintomas intestinais como distensão abdominal e diarreia. Esta intolerância geralmente é dose dependente, e o indivíduo pode tolerar pequenos volumes de leite por dia ou se beneficiar dos leites industrializados com baixos teores de lactose. Portanto, a intolerância à lactose não é uma alergia alimentar apesar de frequentemente confundida pelos familiares e profissionais de saúde. É muito importante esta diferenciação, pois a orientação nutricional é distinta. Enquanto na intolerância à lactose, eventualmente, é possível ingerir pequenas quantidades de leite e produtos apenas isentos de lactose, na alergia às proteínas do leite a alimentação não deve conter nada de leite, nem traços ou derivados.
Qual a prevalência da alergia alimentar?
Estima-se que as reações alimentares de causas alérgicas verdadeiras acometam 6% a 8% das crianças com menos de 3 anos de idade e 2% a 3% dos adultos.
Os indivíduos com outras doenças alérgicas apresentam maior incidência de alergia alimentar?
Pacientes com doenças alérgicas apresentam uma maior incidência de alergia alimentar, sendo encontrada em 38% das crianças com dermatite atópica e em 5% das crianças com quadro de asma.
Quais os fatores envolvidos na alergia alimentar?
A predisposição genética, a potência antigênica de alguns alimentos e alterações no intestino. Existem mecanismos de defesa principalmente do trato gastrintestinal que impedem a penetração do alérgeno alimentar e consequente sensibilização. Estudos indicam que de 50% a 70% dos pacientes com alergia alimentar possuem história familiar de alergia. Se o pai e a mãe apresentam alergia, a probabilidade de terem filhos alérgicos é de 75%.
Quais os alimentos mais frequentemente envolvidos na alergia alimentar?
Qualquer alimento pode desencadear reação alérgica. No entanto, leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim e castanhas, peixe e crustáceos são os mais envolvidos. A sensibilização a estes alimentos (formação de anticorpos IgE) depende dos hábitos alimentares da população. O amendoim, os crustáceos, o leite de vaca e as nozes são os alimentos que provocam reações graves (anafiláticas)com maior frequência.
Os alimentos podem provocar reações cruzadas, ou seja, alimentos diferentes podem induzir respostas alérgicas semelhantes no mesmo indivíduo. O paciente alérgico ao camarão pode não tolerar outros crustáceos. Da mesma forma, pacientes alérgicos à castanha de caju têm maior chance de reagir ao pistache.
E quanto aos corantes e aditivos alimentares?
As reações adversas aos conservantes, corantes e aditivos alimentares são extremante raras, difíceis de serem comprovadas. O corante artificial tartrazina (FD&C amarelo#5), sulfitos e glutamato monossódico são relatados como causadores de reações. A tartrazina pode ser encontrada nos sucos artificiais, gelatinas e balas coloridas enquanto o glutamato monossódico pode estar presente nos alimentos salgados como temperos (caldos de carne ou galinha). Os sulfitos são usados como preservativos em alimentos (frutas desidratadas, vinhos, sucos industrializados).
Quais as principais manifestações clínicas da alergia alimentar? São mais comuns as reações que envolvem a pele (urticária, inchaço, coceira, eczema) e o aparelho gastrintestinal (diarreia, dor abdominal, vômitos). Manifestações mais intensas, acometendo vários órgãos simultaneamente como pele e trato respiratório (anafilaxia), também podem ocorrer.
Nas crianças pequenas, pode ocorrer perda de sangue nas fezes, o que pode ocasionar anemia e retardo no crescimento. Sintomas respiratórios (tosse, sibilância e rinite) isolados são extremamente incomuns.
O que é anafilaxia?
É uma reação súbita, grave que impõe socorro imediato por ser potencialmente fatal. A anafilaxia pode ser provocada por medicamentos, venenos de insetos e alimentos. Na alergia alimentar, o alimento induz a liberação maciça de substâncias químicas que vai determinar um quadro grave de resposta sistêmica associado à coceira generalizada, inchaços, tosse, rouquidão, diarreia, dor na barriga, vômitos, aperto no peito com queda da pressão arterial, arritmias cardíacas e colapso vascular (“choque anafilático”).
O exercício físico pode provocar reação anafilática?
Muito raramente. Associação de ingestão de alimento e exercício físico extenuante também tem sido observada.
O que é síndrome de alergia oral?
É uma manifestação de alergia alimentar que ocorre após contato de determinados alimentos com a mucosa oral. As manifestações ocorrem imediatamente após contato do alimento com a mucosa da boca, ocasionando coceira e inchaço nos lábios, palato e faringe. O edema de glote não é frequente. Ocorre principalmente em pacientes com alergia aos polens e os alimentos mais frequentemente envolvidos são: melão, melancia, banana, maçã, pêssego, cereja, batata, cenoura, ameixa, amêndoa, avelã e aipo.
Como o médico pode fazer o diagnóstico de alergia alimentar?
O diagnóstico depende de história clínica minuciosa associada a dados de exame físico, que podem ser complementados por testes alérgicos.
Na história clínica, é fundamental que o paciente ou seus pais, no caso das crianças, auxilie fornecendo detalhes sobre os alimentos ingeridos rotineiramente ou eventualmente. Em algumas situações, é possível correlacionar o surgimento dos sintomas com a ingestão de determinado alimento. Em outras ocasiões, o quadro não é tão evidente, necessitando de história mais detalhada. Isso ocorre principalmente quando as reações ocorrem horas após a ingestão do alérgeno.
A alergia alimentar ocorre mais frequentemente nas crianças pequenas, e o leite de vaca e o ovo são os alimentos mais comuns. Apesar de muitas vezes incriminado (pelos pais e avós) como causa de alergia alimentar, o chocolate raramente causa alergia. Nestes casos, é preciso pesquisar alergia às proteínas do leite de vaca ou da soja, usadas em sua fabricação. Nos adultos, o camarão é queixa frequente.
A alergia a amendoim e castanhas no geral tem crescido muito em crianças e adultos.
Qual a importância da alergia alimentar na dermatite atópica?
Segundo alguns autores, a alergia alimentar está presente em 38% das crianças com dermatite atópica moderada ou grave.
A dermatite atópica se apresenta com um quadro de coceira de intensidade moderada a grave, irritabilidade, escoriações provocadas pelo ato de coçar a pele, ressecamento generalizado da pele e eczema simétrico nas dobras dos cotovelos e joelhos, pescoço, face e superfície extensora dos braços e pernas. Os alimentos mais envolvidos são leite de vaca e ovo.
O que é o teste cutâneo ou Prick Test?
É um método diagnóstico de alergia seguro e geralmente indolor. Deve ser realizado pelo médico especialista que, após história clínica e exame físico, determinará quais substâncias podem ter importância no quadro clínico e, portanto, deverão ser avaliadas. O desconforto pode ocorrer pelo prurido (coceira) localizado na área do teste, no caso da reação positiva.
Na maioria das vezes, é realizado no antebraço após higiene local com algodão e álcool. O resultado é obtido em 15 a 20 minutos e a reação positiva consiste na formação de uma pápula vermelha, semelhante a uma picada de mosquito. Esta reação indica presença de IgE específica ao alimento testado. Algumas vezes, torna-se necessário realizar o teste com o próprio alimento in natura.
Em algumas situações, o teste cutâneo pode ser substituído pela dosagem de IgE específica no sangue. São elas: necessidade de uso diário de anti-histamínicos (antialérgicos), não disponibilidade de material para teste, presença de eczema severo ou história sugestiva de reação intensa (reação anafilática) a determinado alimento. Muitas vezes, o alergista realiza as duas formas de avaliação para ter maior segurança no diagnóstico.
Como tratar a alergia alimentar?
Até o momento, não existe um medicamento específico para prevenir a alergia alimentar. Uma vez diagnosticada, são utilizados medicamentos específicos para o tratamento dos sintomas (crise), sendo de extrema importância fornecer orientações ao paciente e familiares para que se evite novos contatos com o alimento desencadeante. As orientações devem ser fornecidas por escrito visando a substituição do alimento excluído e evitando-se deficiências nutricionais até quadros de desnutrição importante, principalmente, nas crianças. O paciente deve estar sempre atento verificando o rótulo dos alimentos industrializados buscando identificar nomes relacionados ao alimento que lhe desencadeou a alergia. Por exemplo, a presença de manteiga, soro, lactoalbumina ou caseinato apontam para a presença de leite de vaca. Todas as orientações devem ser fornecidas aos pacientes e familiares.
O que fazer caso venha ocorrer a ingestão acidental do alimento?
A exclusão de um determinado alimento não é tarefa fácil e a exposição acidental ocorre com certa frequência. Os indivíduos com alergia alimentar grave (reação anafilática) devem portar braceletes ou cartões que os identifiquem, para que cuidados médicos sejam imediatamente tomadas. As reações leves desaparecem espontaneamente ou respondem aos anti-histamínicos (antialérgicos). Pacientes com história de reações graves devem ser orientados a portar medicamentos específicos (adrenalina), mas é obrigatório uma avaliação em serviço de emergência para tratamento adequado e observação, pois em alguns casos pode ocorrer uma segunda reação, tardia, horas após.
O paciente que apresenta reação a determinado alimento poderá um dia voltar a ingeri-lo?
Geralmente as alergias a leite, ovo e soja são resolvidas até a adolescência. O teste cutâneo permanece positivo apesar do aparecimento da tolerância ao alimento. A sensibilidade ao amendoim, nozes, peixe e camarão raramente desaparece.
O seguimento é realizado com a dosagem de IgE sérica específica (no sangue) periodicamente. Quando os níveis começam a diminuir é o momento de testar se a alergia está resolvendo. Neste teste, chamado de teste de provocação oral, o indivíduo recebe o alimento no qual é alérgico em doses padronizadas a cada 15 minutos, precedido de avaliação clínica rigorosa, e deve ser realizado por médico habilitado e em ambiente onde seja possível manejar reações alérgicas graves como uma anafilaxia.
Existe algum meio de prevenir a alergia alimentar?
Infelizmente não. No entanto, atualmente a exposição oportuna dos pacientes aos principais alérgenos no momento da introdução de alimentação complementar aos seis meses parece proteger das alergias alimentares. O aleitamento materno deve ser sempre estimulado. Os pacientes de alto risco de alergia alimentar (pacientes com dermatite atópica moderada a grave, alergia alimentar ou filhos/irmãos de indivíduos com doenças alérgicas) também devem ser expostos a todos os alimentos aos seis meses sem necessitar adiar a introdução de alguns alimentos como forma de prevenção.
O benefício do uso de formulas infantis conhecidas como hipoalérgicas para recém-nascidos que não podem ser amamentados ao seio ainda não está bem estabelecido.